Relatório de Gestão CMPC e Fale Conosco

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Por onde andará... Garibaldi Brasil?

(E viva a diferença!)

Marcos Vinícius*

Vejo as cicatrizes das árvores que vivem neste parque-seringal, misto de sede da Fundação, e quase vejo (porque a imaginação não tem limites) a mão que um dia riscou esses troncos imprimindo na madeira marcas da cultura de um povo. Um povo que um dia aprendeu, mas está se esquecendo, que está na entrecasca o leite que alimenta e faz crescer. Por isso, não se pode cortar raso demais porque não há leite na casca, nem fundo demais porque senão se mata a arvore e não podemos matar quem nos alimenta.

Isso me faz pensar em como as coisas mudaram nesse seringal-cidade, misto de capital do Acre, e quase vejo (porque o conhecimento é por natureza ilimitado) as mentes e corações que um dia acreditaram que era possível mudar o mundo com músicas e idéias. Idéias hoje tão confusas em uma pós-modernidade cada vez mais virtual, que parece se esquecer que está na entrecasca do mundo e dos tempos a diversidade que enriquece e faz crescer. Por isso, não podemos mais permanecer na superfície dos acontecimentos, porque esse é o reino de Sansara (ilusão), nem podemos tentar chegar rápido demais ao âmago das situações porque o caminho é longo e tortuoso, como varadouro na mata, e pode faltar fôlego em meio de caminho.

Nesses dias que antecedem a Conferência Municipal de Cultura me sinto como o céu e o chão do Acre no inverno amazônico, encharcados, pesados, repletos dessa bendita água que afasta de vez o fogo, a fumaça e tudo o mais que nos destrói (incluindo os automóveis dos ramais que ainda não conhecem o asfalto). Densidade líquida que apaga o pó e cria o barro. O mesmo barro que um dia foi modelado em figura de homem, produto de uma mão igual àquela que riscou troncos de árvores e imprimiu a marca de uma cultura.

E compreendo, finalmente, que não importa o resultado da Conferência. Não é importante descobrir se o esporte e o turismo vão permanecer na Fundação Garibaldi Brasil, não é importante acordar que a Câmara Temática de Patrimônio Cultural vai ter essa ou aquela composição, como não é importante definir se o Cadastro será apenas um mapa ou uma efetiva forma de controle do sistema. O que interessa de verdade é que durante algum tempo (pra gente na Fundação um longo e denso tempo, ainda que breve no calendário) nos encontramos e discutimos de forma desarmada (umas vezes mais, outras menos) sobre o que acreditamos e com que sonhamos.

Diferentes sim! Há que se reconhecer que somos mesmo muito diferentes. Mas esses dias de intensas discussões, polêmicas e opiniões divergentes deixaram claro que ainda compartilhamos o mesmo objetivo: ser a mão que modela o barro, transmutando o natural em cultural, ou a que risca a árvore até alcançar a entrecasca para fazer escorrer o leite que alimenta e faz crescer uma sociedade antiga, que transmuta a floresta em cidade, sem perder de vista o que foi e o que quer ser.

Vejo as pessoas que trabalham na Fundação correndo pra um lado e por outro e me pergunto: o que diria Garibaldi Brasil, do alto de sua sábia ironia, disso tudo? E quase escuto (porque a percepção é uma coisa infinitamente estranha) aquela voz risonha me soprando aos ouvidos: “Relaxa! Não interessa o resultado. Importante é o processo, as diferenças e o encontro! Quem sabe ainda não seja possível mesmo mudarmos o mundo com músicas e idéias?!!”

Boa Conferência a todos!!!

*Diretor-presidente da FGB

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