Relatório de Gestão CMPC e Fale Conosco

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Mudanças de Verdade*

Está acabando o prazo para a consultoria pública do Programa de Fomento e Incentivo a Cultura, que, se for aprovado, deve substituir a polêmica Lei Rouanet. Para a região Norte, a “mudança de ares” é mais do que necessária. Vocês sabiam que durante os 18 anos de Lei Rouanet, o Acre recebeu menos de 1% do recurso nacional enquanto a cidade de São Paulo teve quase 80% apenas no ano passado?

Algumas pessoas argumentam que isso é obvio, já que São Paulo é o grande pólo industrial do Brasil. É lá que a maioria das grandes empresas reside e por isso é mais fácil de conseguir renúncias fiscais. Verdade. Mas grandes empresas não têm filiais em todo o país, ou em grande parte dele? As empresas telefônicas de São Paulo também não podem ser encontradas em Brasília, Porto Velho ou em Rio Branco? Os bancos normalmente não têm agências em todas as cidades do Brasil? Se os consumidores estão em todos esses lugares, por que as ações feitas por essas empresas devem ser exclusivas no eixo Rio-São Paulo?

Mesmo com esse problema “geográfico” das empresas, isso não explica outro dado importante apresentado pelo Ministério da Cultura: 3% dos proponentes ficam com 50% do recurso. Ou seja, mesmo em São Paulo, onde há uma maior facilidade de se conseguir a tal “troca de bônus”, este recurso está mal distribuído. Muito para poucos.

O PROFIC veio com a promessa mudar esta realidade tão desigual. A proposta é que a renúncia fiscal não seja o carro chefe do apoio à cultura, tendo em vista a baixa participação das empresas. De cada 10 reais captados, apenas 1 real é dinheiro privado e os outros noves são de renúncia fiscal. Ou seja, o dinheiro acaba de qualquer forma saindo dos cofres públicos, então, por que a decisão para onde se destina os recursos deve ficar a critério do mercado? A criação de novas formas de financiamento e estímulos como o Vale Cultura e a Loteria Cultural, além da possibilidade do recurso ser passado do Fundo Nacional para os Estaduais e Municipais, garantindo uma agilidade ao projeto promete modificar esse quadro desigual.

Porém, surge a pergunta: efetivamente, o que muda? As boas intenções do Ministério vão conseguir sair do discurso e garantir um repasse mais justo para outras regiões do país? E tendo em vista que este é apenas um projeto de lei, que pode ser modificado no Congresso, não existe uma grande possibilidade de que as parcerias políticas e econômicas nos bastidores do poder deturpem este projeto? Qual garantia temos que estas mudanças vão, de fato, deixar de beneficiar São Paulo e sua “panelinha” de produções? Além disso, muitos pontos dessa lei geram dúvidas, principalmente na questão das novas formas de financiamento e incentivo a cultura como o Vale Cultura e a Loteria Cultural, que são citados, mas ainda precisam ser explicados e dependem de leis especificas que ainda serão criadas.

O MinC parece olhar de forma diferente para os municípios e as regiões mais desprivilegiadas do país. As relações parecem estar mais próximas e o Sistema Nacional de Cultura avança, ainda que lentamente. Mas é um dever nosso, produtores e consumidores de cultura, prestar atenção nessas mudanças, ouvindo e questionando cada decisão, ela parecendo boa ou não.

*Texto publicado originalmente na coluna Cultura RB no jornal Página 20

Nenhum comentário: