Relatório de Gestão CMPC e Fale Conosco

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Entre livros e letras*


“Ainda acabo fazendo livros onde as nossas crianças possam morar”. Com essas palavras, Monteiro Lobato conseguiu resumir o papel, muitas vezes esquecido, amassado ou rasgado, do livro. Os livros são pequenos universos criados pelos autores ou para os leitores, dependendo do ponto de vista. Cidades fantásticas para crianças ou refúgios (nem sempre tão) seguros para adultos. As letras escritas, sejam em folhas de papel ou através dos bytes dos computadores, são desabafos e “descarregos” colocados em palavras na forma de romances, contos, crônicas ou poemas. Não importa. Literatura é literatura. Ruim, boa ou mediana. É inerente ao ser humano que precisa, constantemente, de um meio de se comunicar. É um processo pessoal que, ao ser exposto aos outros, torna-se público, como todo produto artístico.

Mas, como todo produto, precisa de mercado. Segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Pró-livro, o brasileiro lê em média 4,7 livros por ano, porém existe um fato interessante: o mesmo brasileiro compra 1,1 livros por ano. A grande diferença entre o que se lê e o que é comprado afeta economicamente a indústria do livro, mas o foco da discussão é outro. Segundo a mesma pesquisa, o público que mais lê são os jovens, mas os livros que chegam as mãos destes leitores têm um fim específico: a escola. São paradidáticos usados durante as aulas para trabalhos escolares. Ou seja, o livro está intimamente ligado à formação, e mais do que isso, a compensação. Na mente da maioria dos estudantes, a fórmula é simples: ler um livro + fazer um trabalho = ganhar alguns pontos extras para passar de ano, de forma que os pais não fiquem irritados com as notas baixas.

Só que esta ligação traz um problema. O que acontece com esses leitores depois que saem da escola e não são mais obrigados a ler para fazer uma prova de português? A resposta vem na própria pesquisa: eles param. E é aí que se encontra o verdadeiro problema dos escritores, que não têm para quem escrever, e acabam guardando nas estantes de suas casas pilhas e pilhas de livros publicados, com muito esforço, por editoras independentes, ou através de gráficas. Neste cenário – não apenas local, mas nacional – não é à toa que não existam editoras empenhadas em promover a literatura local, produzida no próprio país, ou em cidades longes dos grandes pólos econômicos e culturais.

No Acre, esta produção literária é quase artesanal. As gráficas tomam o lugar das editoras que não existem. Aqui muitos escrevem, poucos publicam e menos ainda chegam a vender. Assim, como mudar este problema? O que precisa ser feito para criar este público? Como fazer os jovens, adultos ou crianças terem o gosto pela leitura, quererem ler? Ansiarem por viver em mundo diferentes, dentro de si ou de outros? O que fazer para que os jovens parem de largar os livros para usar MSN ou Orkuts? Ou melhor, como fazer essas ferramentas contemporâneas ajudarem na criação ou na qualificação destes leitores?

De acordo com a pesquisa realizada pelo instituto Pró-Livro, os brasileiros estão lendo mais em relação aos anos anteriores. A influência da escola na formação desses “novos leitores” é fundamental. A criação de programas de incentivo a leitura, pontos de leitura, casas e bibliotecas facilitam a mudança deste quadro. Mas, os avanços feitos nos últimos anos na criação do, ainda pequeno, público do Brasil se devem à ligação com a escola, e à inclusão dos paradidáticos nas avaliações. Mas quando a discussão vai avançar? A escola está aí, ajudando e tentando fazer a sua parte. Mas as pessoas não ficam eternamente na escola. E depois que elas saem, para onde irão esses leitores? Ou vamos nos contentar em sermos um país de paradidáticos?

* Texto publicado originalmente na Coluna CulturaRB, no jornal Página 20

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